domingo, 18 de agosto de 2013

Estava, há pouco, pensando. Sim, confinado em meu leito, envolto em forros acetinados e travesseiros de penas de ganso com bilros, eu penso. Vejam o lado bom: enquanto estou guardado aqui, sob severa vigilância de enfermeiras russas e caucasianas, as ruas estão mais seguras. As velhinhas podem perder as moedinhas no caixa do supermercado e os donos de boteco estão livres de eventuais calotes. Aproveito, pois não se sabe quando inventarão uma geringonça que leia pensamentos. Tenho medo de fazer xixi na pia e saltarem na minha jugular uns dez agentes da CIA, me jogando numa cápsula hermética e desovando no quintal da minha primeira professora de matemática, pra plantar batatas e raízes quadradas. É a globalização. Me sinto vigiado, reprimido, monitorado por outros seres humanos que sabem mais da minha vida do que eu. Acho que isso é paranóia, só pode. Quem, mais ou menos estúpido, perderia tempo e equipamentos sofisticados pra descobrir que eu consigo roer as unhas dos pés e que roubo os chocolates suíços da Dona Vilma, minha vizinha surda. E que jogo cubos de gelo na cabeça do cachorrinho histérico da Eva Porosa, a cabeleireira da casa ao lado. Cubo de gelo não deixa pistas do crime! Eles sabem que sou um criminoso em contenção, controlado mas perigosíssimo! Ontem, Seu Hermínio recebeu visita de um parente e consegui colocar no bolso do cara um bilhete: "Tirem-me daqui, estou sendo cobaia de experiências terríveis. Ligue para Tio Demêncio!". Mas esqueci de escrever o número do Tio Demêncio, caraca! Não importa, outras oportunidades surgirão! Acho melhor parar de pensar, aproxima-se a plantonista, sinto seus passos como Godzilla entrando em Nova Iorque. Com punhados de pílulas lilases e um pacote de mandiopã. Vou ter que desligar, é perigoso. Não esqueçam a senha: "O morcego é o anjo do rato", não esqueçam, adeus!

Nenhum comentário:

Postar um comentário