sábado, 15 de fevereiro de 2014

EASTWOOD 
Ontem lembrava dos bailes dos clubes Recreativo e Comercial, em São Borja, com Os Dinâmicos ou Os Sheiks tocando, alucinados, músicas que ainda não havia no Brasil, tipo Barrabas, Nazareth e uma que nunca faltava e eu adorava: Photograph, do Ringo Starr!
A gente não entendia uma só palavra do que os caras cantavam, mas lá estávamos; cigarro dependurado no canto da boca, olhar fulminante de Clint Eastwood encarando o Lee Van Cleef e sua cara de galinha assassina, balançando a mão sobre o Colt 44 que era um copo de cuba-libre librando-nos de todo o medo, amém! 
Acho que não existe mais esse tipo de baile, encontros furtivos detrás das cortinas e o cantor do conjunto entoando Me and You, Dave Maclean, orgástico melacueca dos anos 70. Hoje nem é mais o cantor do conjunto, é o vocal da banda. Outrora foi o crooner da orquestra, vejam só! 
Cabelos longos, calças boca-de-sino e o legítimo patchouli encharcando nossas roupas. Éramos felizes e sabíamos disso, embora nossa vida sexual fosse mais verdadeira que promessa de amor naquelas noites escancaradamente divertidas. 
Tudo ficou mais banalizado; menos romântico, mais pasteurizado e pouco conquistado, tudo rápido demais, sabem? A garotada sai da universidade e se, em um ano não estiverem no topo da hierarquia entram em profunda depressão, tudo precisa ser agora, que coisa!
Quando eu tinha uns 15 anos havia um pesado constrangimento pra se chegar em qualquer bar ou armazém e comprar Colomy* pra fechar os baseados. Imaginem três ou quatro pirralhos entram no estabelecimento e pedem Colomy pra quê, valha-me São Torpor, o protetor dos boleteiros? E tirar aquela casquinha metálica das carteiras de Carlton era uma bosta, precisava muita paciência, coisa que nos faltava. 
Numa noite, aproveitando estar um amigo sozinho em casa, tomamos conta de sua residência em alegre e saltitante bando, cheios de cachaça e mandioca frita. Sem querer, me vi no quarto da avó do anfitrião e me deparei com um Evangelho Novo Testamento sobre a mesinha de cabeceira, ao lado de um Santo Antônio, me olhando, melancólico.
Heresia dizer que uma luz divina me fez pegar o Livro e descobrir, em suas folhas, nossa salvação! Folhas fininhas, suaves, um encanto, amigos! Adeus Colomy e seda do Carlton, adiós!
Acho que já paguei esse pecado aqui na Terra, não tenham duvidas, queridos e queridas coleguinhas.
Definitivamente os tempos são outros.
Boa noite pra vocês todos e ótima semana!

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